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Memórias de vidas passadas: um olhar atual sobre o fenômeno no Brasil

Em um episódio recente gravado para o podcast da Folha Espírita, três pesquisadores do Núcleo de Pesquisas em Espiritualidade e Saúde (Nupes), da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), compartilharam suas reflexões sobre o fascinante tema das memórias de vidas passadas. O médico Eric Vinícius Ávila Pires e os psicólogos Sandra Maciel de Carvalho e Lucam Justo de Moraes discorreram sobre os avanços científicos nessa área e como o fenômeno está sendo estudado tanto em crianças quanto em adultos.

Trabalhos de Eric, Sandra e Lucam sobre memórias de vidas passadas se transformaram em teses de doutorado

Moraes lembrou do legado do psiquiatra Ian Stevenson, cujo trabalho na Universidade da Virginia, a partir da década de 1960, marcou o início das investigações científicas sobre crianças que alegavam se lembrar de vidas passadas. Stevenson documentou mais de 2,5 mil casos em todo o mundo, e a sistematização de seus métodos abriu caminho para pesquisadores como Jim Tucker e Erlendur Haraldsson.

Com um menor volume de pesquisas após a morte de Stevenson, em 2007, o papel do Nupes ganhou grande relevância. Segundo Sandra, uma nova vertente tem ocupado espaço em seus estudos: as memórias de vidas passadas em adultos. “A pesquisa de Stevenson focava em crianças e pouco se sabia sobre adultos que relatam essas memórias”, explicou, salientando que o Nupes assumiu a tarefa de preencher essa lacuna, realizando o primeiro Inquérito Nacional com adultos cujas memórias surgiram ao longo da vida, algo que não havia sido realizado em nenhum país.

Essa iniciativa resultou em uma pesquisa online com 402 participantes de diversas regiões do Brasil, com perfil marcadamente feminino e de alta escolaridade. Sandra observou que esse padrão contrastava com as pesquisas anteriores, nas quais a maioria dos casos era de meninos. “Mulheres tendem a participar mais de pesquisas, a gostar mais de compartilhar suas experiências, mas há a hipótese também de que, no Brasil e/ou entre adultos, os casos sejam majoritariamente de mulheres. O perfil educacional elevado dessas participantes (68% com graduação e até pós-doutorado) desafia a ideia do senso comum de que experiências espirituais estariam relacionadas ou seriam relatadas por pessoas com baixo nível de instrução”, apontou a psicóloga.

Moraes destacou que o objetivo dos estudos é entender como as memórias evoluem e quais impactos elas têm ao longo da vida. “Queremos seguir essas crianças e adolescentes para observar como as memórias mudam com o tempo e como elas afetam seu desenvolvimento”, explicou o pesquisador, que criou o questionário da pesquisa com Sandra. Diferentemente da colega, que ficou com adultos, Moraes seguiu com crianças e adolescentes, replicando o modelo de estudo de Ian Stevenson, com o qual se investiga a personalidade citada falecida.

Pires realizou pesquisa com adultos que alegaram memórias de vidas passadas na infância e, recentemente, teve seu trabalho premiado como melhor pôster no NOEx Workshop, evento sobre experiências não ordinárias realizado pelo Instituto D’Or. O pesquisador ressaltou a relevância científica do fenômeno das memórias de vidas passadas e afirmou que, embora a pesquisa tenha avançado, ainda existem muitas áreas a serem exploradas. “Estamos apenas arranhando a superfície dessas alegadas memórias”, disse o médico, destacando que o Brasil, com iniciativas como as do Nupes, está se posicionando na vanguarda dos estudos sobre experiências espirituais e saúde.

Circunstâncias traumáticas e sofrimento

Os pesquisadores revelaram que a maioria das memórias relatadas está ligada a circunstâncias traumáticas de morte, como guerras, assassinatos e suicídios. Esses relatos são particularmente marcantes devido à intensidade emocional e ao sofrimento que evocam, o que, segundo eles, pode explicar sua persistência. “Essas memórias de mortes violentas são as mais comumente relatadas”, acrescentou Sandra, mencionando que tal padrão é observado tanto em crianças quanto em adultos.

Apesar de muitos relatos serem carregados de dor, Sandra refutou a visão popular de que quem lembra de vidas passadas sempre foi uma figura de destaque, como reis ou princesas. “As memórias são, na maioria das vezes, de pessoas comuns, muitas vezes com finais trágicos”, explicou.

O diálogo entre os pesquisadores também tocou em questões culturais, comparando a aceitação do fenômeno no Brasil com países asiáticos, onde a reencarnação é mais amplamente reconhecida. “Há uma diversidade cultural que influencia como esses relatos são vistos”, afirmou Pires, que lembrou da necessidade de mais estudos robustos para compreender plenamente como essas memórias surgem e como elas se manifestam ao longo da vida.

Ouça a entrevista completa no podcast da Folha Espírita e confira os trabalhos publicados por esses pesquisadores:

CARVALHO, Sandra Maciel de. Inquérito nacional de casos sugestivos de reencarnação na população brasileira adulta. 2023. Doutorado (Mestrado em Saúde) – Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, 2023. Disponível em: https://repositorio.ufjf.br/jspui/handle/ufjf/16316

MORAES, Lucam Justo de et al. Children who claim previous life memories: A case report and literature review.Explore, v. 20, 2024. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1550830724001708

MORAES, Lucam Justo de et al. Estudos acadêmicos sobre alegadas memórias de vidas passadas: uma revisão de escopo. Explore, v. 18, p. 371-378, 2022. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1550830721000951

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